A Amiga Genial, Elena Ferrante
Fiquei na dúvida que classificação dar a este livro, se 4 ou 5 estrelas, não só por todas as opiniões que ouvi de que os próximos são melhores (então para quê gastar já a nota máxima?), mas porque sinto que me faltou alguma coisa.
Já toda a gente sabe que a história é sobre duas amigas. Lenú é a narradora que, no alto dos sessenta anos, decide escrever sobre a sua vida, centrada na amizade que tem com Lila desde a infância. Pelo meio vamos conhecendo o bairro modesto de Nápoles onde cresceram, assim como os seus vizinhos e amigos. Parece simples, não é? Mas é tudo muito mais complexo do que estão à espera.
Achei a primeira parte, sobre a Infância, um bocadinho aborrecida. Percebo que era importante para percebermos o background delas e porque se volta àquela época regularmente para se explicar alguns factos que vão ser essenciais no caminho das personagens. Ainda assim, não me cativou. A segunda parte, sobre a Adolescência, já me envolveu mais, já me consegui relacionar a história, ainda que seja passada nos Anos 60. Mas o final ficou aquém das minhas expectativas. Esperava que houvesse algum acontecimento que me fizesse ficar louca para ler o segundo volume logo a seguir e isso não aconteceu. E por estas razões, dei quatro estrelas e não cinco. Mas gostei bastante e é realmente um livro bom.
E o que é para mim um livro bom? Além de bem escrito, com uma história interessante, profunda e credível, são livros que nos fazem sentir. Seja o que for. E este livro fez-me refletir sobre a minha própria infância e adolescência, fez-me recordar tempos de escola e fez-me pensar em amizades que tinha na época. Algumas ainda hoje mantenho, outras nem por isso. Este livro fez-me olhar para a minha evolução e crescimento como pessoa desde a altura em que tinha 15 anos, que olhava para o futuro incerto com ansiedade, ao mesmo tempo que achava que já sabia tudo. Foi uma leitura importante por isso mesmo. Nenhuma, até hoje, me tinha feito viajar a certas recordações que estavam guardadas numa gaveta no fundo da memória e ficar a pensar nelas com o livro pousado no peito.
Bem-haja ao índice das personagens no ínicio do livro...era toda uma confusão durante a leitura sem ele.
Mas afinal quem é a Elena Ferrante? Uma autora que não dá a cara, só responde a entrevistas por escrito e diz preferir ser conhecida pelas suas palavras e não pelo seu aspecto. Será que é só por isso mesmo? Sinto que toda a historia é um aglomerado de factos sobre a vida daquele bairro e daquelas duas miúdas. Pensei, várias vezes enquanto lia, que é uma obra autobiográfica, que a autora se sentou a escrever a sua própria história, a história do bairro em que cresceu e de uma grande amizade sua. Que desabafou tudo o que quis naquelas páginas, incluindo alguns pormenores que não aquecem nem arrefecem, romantizando um bocadinho alguns factos. Posso estar enganada. Mas juntamente com o facto de ela não querer revelar a identidade com medo de "virar alvo de hostilidades públicas", essa teoria ganha força.
“Estou habituada a escrever como se estivesse a repartir um espólio. A uma personagem atribuo uma característica de Fulano, a outra uma frase de Beltrano. Reproduzo situações em que pessoas, que conheço ou conheci, se encontraram de facto, revivo experiências verdadeiras. (...) De modo que aquilo que escrevo está cheio de referências a situações e acontecimentos que realmente se deram, mas que foram reorganizados e recriados como nunca ocorreram.” - Lido, aqui.
E a questão que se impõe no final da leitura é: Quem é, afinal, "A" amiga genial? A Lila ou a Lenú?
(Capas italiana, espanhola, brasileira e norteamericana)
E a tradução? Não deve ter sido um trabalho fácil, mas certas palavras e expressões irritaram-me. Não sei como está o original, nem peço que traduzam as obras de forma a simplificarem a sua linguagem a um ponto básico quando não é assim que o autor original escreve. Mas houve palavras utilizadas demasiadas vezes como, por exemplo, “altercação”, quando podiam de vez em quando ter usado sinónimos. A utilização do gerúndio também me incomodou, como “o que ela estava sentindo”, sendo que não estamos a traduzir para brasileiro nem para alentejano. Mas vá, são pormenores e não foi por isso que gostei menos da história.
Título: A Amiga Genial
Autor: Elena Ferrante
Edição: Relógio D'Água, 2014
Ano de publicação: 2011
Nº páginas: 264