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SAY HELLO TO MY BOOKS

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Qua | 20.09.17

O Vermelho e o Negro, Stendhal

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Na semana passada dediquei-me a este clássico francês do séc. XIX, obra escolhida para o Clube dos Clássicos Vivos. Fiz uma coisa que nunca faço antes de começar a ler um livro: fui pesquisar informação sobre a obra, o autor (caso nunca tenha lido nada dele) e tentar pôr-me a par de todo o contexto histórico de quando foi escrito. Sabia apenas que se tratava de um romance histórico, publicado em 1830, em França, e achei por bem saber mais antes de mergulhar 400 páginas que nos contam a jornada do protagonista Julien Sorel. Fugindo de spoilers, essa pesquisa ajudou-me muito a compreender todo o ambiente do enredo, principalmente no início. 

 

É um livro com um ritmo de leitura mais lento, pelo menos para mim, que pede atenção redobrada aos parágrafos, às expressões, às ideias que o autor quis contar. Por isso fui lendo no ritmo que o próprio livro ditava e gosto muito quando isso acontece, são eles que nos levam. É um daqueles clássicos que impunha respeito e, até, algum preconceito sobre ser "chato e pesado". Li-o de uma ponta à outra, sem nunca perder o interesse nem o ritmo. O século XIX é riquíssimo em histórias e acontecimentos que ditaram a evolução do século seguinte, interessantíssimo cultural e socialmente e, por isso, fiquei muito envolvida com a história.

 

O PROTAGONISTA 

Acompanhamos a jornada de Julien Sorel, desde que é o pobre filho de um simples camponês, em Verriéres, passando pelo seminário e, depois, tornando-se no braço direito de um importante marquês de Paris. Mas, mais do que a sucessão de acontecimentos na vida de Julien, acompanhamos a sua evolução enquanto homem, a nível de personalidade, sentimentos e compreensão do mundo, algo que tornou este livro inesquecível, para mim. No início chamei-lhe nomes, critiquei-o, considerei-o detestável, até começar a simpatizar e a torcer por ele, e chegar ao fim apenas com pena e compaixão. Tornamo-nos cúmplices do protagonista e, mesmo não concordando com o que ele faz, acabamos por compreendê-lo.

 

Julien é hipócrita assumido, egoísta, ambicioso, calculista e provocador. Sem qualquer sentimento sincero de amizade ou amor por alguém. Mesmo depois de terminar, não acredito que tenha amado ninguém. Queria apenas o que não podia ter e, assim que conseguia o que desejava, deixava de o querer. Era a conquista que lhe dava gozo, mas nunca estava satisfeito por muito tempo. Apesar da aparente segurança que quer transmitir, vivendo num clima de aparências, vamos conhecendo os seus receios e até fraquezas. O que o torna num personagem muito completo. Ainda assim, é uma sensação de falsa proximidade com o leitor, porque creio que apesar de entrarmos na sua cabeça em todos os momentos, nunca o ficamos a conhecer na totalidade. 

 

"Naquela singular criatura, quase todos os dias eram de tempestade."

 

 O AUTOR 

Stendhal vai conduzindo o leitor ao longo da obra. Considerada como um romance psicológico, conseguimos saber o que várias personagens estão a pensar, não só o protagonista. Achei interessante a crítica social aqui presente, pois numa sociedade com uma hierarquia fortemente estabelecida, Stendhal situou Julien em várias classes sociais e pôde, assim, alfinetar todas elas, desde os camponeses, ao clero, à nobreza e a monarquia. É um livro que realmente transcende o período em que foi escrito. O próprio Julien tem algumas particularidade de Stendhal como a pouca sorte no amor ou o pouco jeito para andar a cavalo. Dono de pensamentos liberais e admiração por Napoleão, assim como o seu protagonista, Stendhal é um dos pseudónimos utilizados pelo francês Henri-Marie Beyle. Gosto muito do facto de o narrador falar diretamente com o leitor durante toda a obra.

 

"Desde que não se troçasse nem de Deus, nem dos padres, nem do rei, nem das pessoas de posição,

nem dos artistas protegidos pela corte, nem de qualquer instituição; desde que não se dissesse bem dos jornais da oposição, nem de Voltaire, nem de Rousseau, nem de tudo o que permita um pouco de abertura; desde, sobretudo, que nunca se falasse de política, podia-se livremente comentar tudo."

 

O TÍTULO 

"O Vermelho e o Negro" já teve várias interpretações ao longo dos anos. A mais comum é "vermelho" ser referente às fardas militares da época napoleónica e "negro" às batinas próprias do clero, duas áreas em que Julien Sorel se viu dividido, pesando sempre qual seria aquela que lhe daria mais riqueza e prestígio. Mas, por outro lado, (e falámos disto no Clube) penso que podemos olhar para o título como sendo o vermelho do coração em estado puro e vivo, a cor da paixão em comparação com o negro da tristeza, da depressão, do sofrimento sempre muito presente na jornada de Julien. 

 

SRA. DE RÊNAL vs. MATHILDE

Será que as duas amaram Julien? E que foram as duas amadas por ele? Na minha opinião, o único sentimento de amor verdadeiro que vimos nesta obra foi da Sra. de Rênal por Julien. Mathilde é apenas uma miúda rica, mimada, caprichosa que só achou ter algum sentimento quando foi desprezada ou diminuída a nível de importância, como no final. Já Julien não creio que amou verdadeiramente nenhuma das duas. "Usou-as" quando lhe deram jeito, fosse para atingir certos fins de estatuto, por vingança dos homens que o rodeavam, por capricho também ou por uma ilusão nascida do fraco amor-próprio que as atenções delas lhe despertavam. 

 

A GRANDE LIÇÃO 

"É singular, contudo, que só tenha aprendido a arte de gozar a vida depois de lhe avistar o termo tão próximo". Não é preciso dizer mais nada. 

 

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Título: O Vermelho e o Negro

Autor: Stendhal

Edição: EDICLUBE 

Ano de publicação: 1830

 Nº páginas: 406

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